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Epidemia de feminicídios expõe raízes históricas do ódio às mulheres no Brasil

Casos brutais recentes e dados recordes revelam a persistência de uma violência que atravessa séculos e mostram como o machismo ainda mata.

Epidemia de feminicídios expõe raízes históricas do ódio às mulheres no Brasil
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Nas últimas semanas, o Brasil assistiu a uma sucessão de crimes brutais contra mulheres, revelando que a atual explosão de feminicídios não é um fenômeno isolado, mas parte de uma longa e dolorosa trajetória de violência de gênero. Em diferentes cidades do país, jovens foram estupradas, estranguladas, baleadas, atropeladas e arrastadas por ex-companheiros ou homens que não aceitavam o fim de uma relação ou a autonomia feminina.

A escalada é evidente: o país registrou 1.492 feminicídios em 2024, o maior número desde a tipificação desse tipo de crime. Em São Paulo, somente este ano, foram contabilizados 53 casos na capital, além de um aumento de 10% no estado. Crimes contra mulheres em vias públicas também quase dobraram no período. E a violência migrou para o ambiente digital: no Rio de Janeiro, denúncias de perseguição e assédio virtual cresceram mais de 5.000% na última década.

Especialistas afirmam que a disseminação de discursos misóginos nas redes sociais radicalizou ainda mais o ódio às mulheres, tornando a violência um produto rentável e amplificado. Mas, como aponta a historiadora Patrícia Valim, da UFBA, a misoginia não é novidade: ela é estruturante na formação social brasileira.

Segundo a pesquisadora, “o desenvolvimento econômico, político e cultural do Brasil se sustentou historicamente na desumanização de mulheres, por meio da exploração colonial, do trabalho escravizado, do controle do corpo e da vigilância permanente”. A violência, portanto, não é acidental — ela é constitutiva.

Histórias que revelam o passado e explicam o presente

Valim resgata registros de mulheres que foram assassinadas entre os séculos XIX e XX, quando o feminicídio sequer tinha nome. Eram mortas por ousarem conduzir suas próprias vidas — e os assassinos frequentemente eram absolvidos com argumentos como “loucura momentânea” ou a chamada “legítima defesa da honra”, tese usada durante décadas para justificar crimes cometidos por maridos, noivos ou namorados.

Um desses casos é o de Júlia Clara Fetal, assassinada em 1847 pelo ex-noivo João Estanislau da Silva Lisboa, que não aceitava o fim do relacionamento. O julgamento marcou a primeira vez em que a tese da “defesa da honra” foi usada para aliviar a pena de um assassino — conceito que perdurou por quase dois séculos até ser declarado inconstitucional pelo STF apenas em 2023.

Enquanto os autores de assassinatos eram frequentemente retratados como homens “honestos” que perderam o controle por amor ou ciúmes, as vítimas tinham suas histórias distorcidas ou apagadas. Muitas vezes eram descritas como provocadoras, traidoras ou culpadas pela violência que sofreram.

É justamente essa lógica — histórica e ainda presente — que especialistas afirmam continuar sustentando os feminicídios no Brasil de hoje.

O Brasil entre os países mais perigosos para mulheres

O problema é tão grave que o país figura entre os cinco com maior número de mortes violentas de mulheres no mundo. O feminicídio é um crime motivado pela condição de gênero: acontece quando a mulher é morta por ser mulher, em contexto de discriminação, ódio ou menosprezo. Embora nem todo assassinato de mulher seja feminicídio, os índices apontam um padrão claro de violência baseada no machismo.

A expressão “o machismo mata”, tantas vezes repetida, resume uma realidade brutal: no Brasil, mulheres seguem morrendo porque seus corpos, suas escolhas e suas vidas continuam sendo tratados como propriedade masculina.

Mobilização nacional

Diante desse cenário, movimentos como o Levante Mulheres Vivas realizam hoje manifestações em todo o país para denunciar a barbárie e exigir que as instituições — da segurança pública ao Judiciário — atuem de forma efetiva contra a violência de gênero. Para Valim, relembrar as histórias de mulheres do passado é parte fundamental dessa luta.

“Resgatar essas vidas é desafiar o ciclo de apagamento e impedir que a sociedade siga naturalizando o feminicídio”, afirma a historiadora.

Enquanto o Brasil enfrenta números assustadores e casos diários de extrema crueldade, especialistas, familiares de vítimas e movimentos sociais reforçam: compreender a dimensão histórica da violência é essencial para combatê-la no presente. E garantir que mulheres possam viver — e não apenas sobreviver — continua sendo um dos maiores desafios do país.

FONTE/CRÉDITOS: G1 — reportagem de Patrícia Valim e Ruan de Sousa Gabriel (07/12/2025) e UOL Vestibular — texto de Carolina Cunha (Novelo Comunicação).
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